A história do repente mostra que o encontro dos velhos
repentistas do Nordeste difere bastante das pelejas de hoje. A arte de improvisar sofreu sérias modificações, no tempo e
no espaço. A cantoria foi enriquecida com a criação de inúmeros estilos.
Por outro lado, a temática se atualizou com a exigência da
urbanização do repente e a alfabetização dos violeiros. A mídia teve papel importante na valorização e atualização
dos conceitos debatidos nos encontros dos improvisadores do momento mais
preocupados com os problemas da violência, da corrupção, do desnível social e
das transformações naturais da sociedade.
Os repentistas de hoje acompanham os noticiários de rádios e
jornais para se atualizarem com os acontecimentos do planeta, uma vez que os
motes pedidos pela plateia enfocam temas modernos e de maior profundidade que
exigem dos preliantes uma formação cultural atualizada.
As próprias novelas servem de referência para cantoria que,
no momento, deve atender o espírito de curiosidade dos presentes a par dos
fatos e acontecimentos informados pela mídia. Vamos apreciar um trecho do desafio travado entre José
Gustavo e Rouxinha da Bahia. Observem a diferença entre a cantoria do passado e
a que hoje se pratica.
RB - Senhor
Gustavo sou neta
Do Roxinho da
Bahia,
Como cantor em
seu tempo,
Foi um dos
melhores que havia,
Faleceu e dele
herdei
Dom, agrado e
simpatia.
JG - Ouvi
dizer que Rouxinho
Foi bom cantador,
outrora,
Se sua cova se
abrisse
E ele aparecesse
agora,
Eu tinha menos
receio
Do que cantar com
a senhora.
RB - Tenha
remendo ou não tenha,
Na peleja perca
ou ganhe,
Aperte os botões
da calça,
Brinque, prose e
não se acanhe,
Que eu hoje canto
até missa
Se achar quem me
acompanhe.
JG - A
senhora hoje faz tudo,
Porque está entre
os seus,
Eu me humilho
como Jó
O poeta dos
hebreus,
Porque só tenho
por mim,
Viola, garganta e
Deus.
RB - Ainda
você estando
Dos anjos
arrodeado,
São Miguel de
espada em punho,
Santo de todos os
lado,
Eu dava-lhe um
chá de pisa
Que você está
precisado.
JG - Dona
Rouxinha eu lhe aviso
Quem luta contra
o José,
Tem ânsia, dor de
barriga,
Fica sem ânimo e
fé,
Cai o queixo,
entorta a língua,
Perde o nariz, seca
o pé.
RB - Eu
zangada subo pedra
Veloz que só
lagartixa,
Pego onça pela
cauda,
E tiro o couro da
bicha,
Derreto negro no
tacho,
Tiro a pele e
faço lixa.
JG - Roxa,
tu derrete outro,
Não é um igual a
eu,
Porque para
derreter-me,
Mulher inda não
nasceu,
Se nasceu com
esse plano,
Deu-lhe a leseira
e morreu.
RB - Cantor
pra cantar comigo,
Precisa ter
teoria,
Conhecer
aritmética,
Estudar
filosofia,
Discriminar
consciente
Gramática e
geografia.
JG - Eu
garanto que a senhora
Não analisa
gramática,
Que é um livro
teórico,
De certeza
matemática
Não é pra um
burro que apenas
Come capim pela prática.
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